Ao longo de quase meio século de regime de ditadura, de índole colonialista e fortemente repressivo, através da polícia política (PIDE) e das forças da Guarda Nacional Republicana (GNR), houve muitos cidadãos que tiveram a coragem e a dignidade de lutar pela democracia e pela liberdade.
Desde operários, com greves e manifestações, a intelectuais com as suas obras literárias e conferências, a jovens estudantes, foram durante várias décadas contributos para o que haveria de ser a Revolução de 25 de Abril de 1974.
No que se refere à região algarvia, também é de registar alguns factos históricos que contribuíram para a Revolução, e que abaixo mencionamos.

Os 40 anos que antecederam o 25 de abril: uma cronologia
❦ 1934 ❦
18 de Janeiro
Ocorreram greves e manifestações operárias em diversas localidades do País, como forma de protesto contra a Lei que determinou a extinção das associações de classe e sindicatos livres, e que atingiram maior expressão na Marinha Grande, Barreiro e Almada, mas também em Silves e Algoz no Algarve. Pretendia-se então a substituição destas associações livres por sindicatos corporativos.
Logo no início da manhã, em Silves, colocaram-se piquetes nas entradas da cidade, uns de anarquistas outros de comunistas, avisando os trabalhadores de que havia greve. Depois, Manuel Pessanha, o principal agitador, percorreu com Virgílio Barroso e Francisco Nicolau as fábricas incitando os operários à greve, que veio a ser praticamente total, com mais de 800 corticeiros paralisados.
Em Lisboa, rapidamente houve conhecimento da grande adesão em Silves, pois o ministro do Interior foi informado por telegrama enviado de Faro. As forças da GNR de Silves, juntamente com os reforços vindos da capital algarvia e de Monchique, iniciaram então a caça aos revoltosos, incluindo na zona serrana.
Foram detidos e levados a julgamento 35 operários, sendo 23 do grupo anarquista e 12 do grupo comunista, que ficaram no Forte da Trafaria. Seriam depois deportados para Angra do Heroísmo (Açores) seguindo no navio “Carvalho Araújo”, a 8 de Setembro de 1934, e a maioria deles haveria de cumprir 12 anos de prisão. Com efeito, mais tarde alguns dos presos políticos algarvios foram transferidos para a Colónia Penal do Tarrafal, e só voltaram ao continente em 1943, mas para o Forte de Peniche, sendo restituídos à liberdade em 1946. Em consequência destes distúrbios as fábricas de Silves só vieram a reabrir 21 dias depois.
É aqui de registar também, importantes paralisações no Algoz (operários das fábricas de cerâmica), e de ferroviários nas estações de Tunes e da Funcheira. A violenta repressão foi um rude golpe no movimento operário em Silves, e noutros locais do Algarve e do País.
❦ 1935 ❦
13 de Maio
São expulsos do Ensino Superior 33 professores antifascistas, com base no Decreto-Lei nº 25317, dessa data.
3 de Agosto
Faleceu em Huelva o ilustre advogado olhanense Manuel Paula Ventura, que se encontrava exilado nesta cidade da Andaluzia, por ter sido proibido pelo regime de ditadura de Oliveira Salazar, de residir em Portugal durante um período de dois anos. No campo político, um democrata e republicano, ao longo da vida Manuel Paula Ventura tomou atitudes que motivaram que fosse perseguido e preso várias vezes pelas autoridades policiais ao serviço do governo fascista.
11 de Novembro
É preso em Lisboa, Bento António Gonçalves, secretário-geral do Partido Comunista Português (PCP).
❦ 1936 ❦
23 de Abril
O Decreto Lei nº 26539 criou uma Colónia Penal no lugar do Tarrafal, na Ilha de Santiago (Cabo Verde), cujo objectivo era punir de forma implacável os presos políticos portugueses.
18 de Agosto
Foi assassinado em Granada o poeta, dramaturgo e antifascista Federico García Lorca, pelas tropas ao serviço do ditador general Francisco Franco. García Lorca nasceu em Fuente Vaqueros, na vizinha Andaluzia, a 5 de Junho de 1898. Era uma figura muito admirada pelos antifascistas e intelectuais portugueses.
8 de Setembro
Revolta dos Marinheiros em Lisboa, que ocuparam os navios de guerra “Bartolomeu Dias”, “Dão” e “Afonso de Albuquerque”, os quais se encontravam fundeados no rio Tejo. Entre os revoltosos, encontravam-se alguns marinheiros algarvios, como António Marreiros, Tomé Baptista Marreiros e Joaquim Marreiros.
É de salientar que este movimento contra o regime de ditadura foi conduzido apenas por cabos, marinheiros e grumetes, ou seja, pelas classes mais baixas da hierarquia militar da Marinha. Acontece que a polícia política e o ministro da Marinha, tiveram conhecimento antecipado do golpe, e as autoridades militares, incluindo meios aéreos, rapidamente anularam a revolta.
Foram então detidos 34 marinheiros, que vieram a ser deportados para a sinistra colónia penal do Tarrafal (Cabo Verde), que havia sido inaugurada poucos meses antes. O marinheiro Joaquim Marreiros, natural de Lagos, viria a falecer no Tarrafal a 3 de Novembro de 1948, com 38 anos de idade.
3 de Novembro
João Feliciano Galvão, um jovem residente com os seus pais na aldeia de Moncarapacho, foi detido e levado pela PIDE. Nunca mais foi visto, representando mais um dos hediondos crimes cometidos pelas autoridades policiais ao serviço do regime de ditadura, dirigido por Oliveira Salazar.
❦ 1937 ❦
20 de Abril
Realizaram-se manifestações conduzidas por comissões locais dos pescadores do bacalhau, na sequência do Decreto que os obrigava à matrícula no navio bacalhoeiro da campanha do ano anterior, e também contra as condições salariais determinadas pelo Governo.
Neste dia, a Fuzeta foi ocupada por forças da GNR e da PSP. Na então aldeia piscatória da Fuzeta, a localidade do Sul que, em percentagem, mais marítimos forneceu para a faina maior, foram perseguidas e detidas 101 pessoas, entre marítimos e seus familiares. A ordem de prisão foi dada por Henrique Tenreiro, o homem forte do sector das pescas e da marinha, e os detidos foram distribuídos pelos estabelecimentos prisionais de Faro e de Tavira.
Depois, os pescadores foram transportados sob prisão para o Quartel dos Marinheiros, em Lisboa. A seguir, foram obrigados a matricular-se, e a embarcar nos navios com destino aos bancos de pesca da Terra Nova e Gronelândia, em pleno Círculo Polar Ártico. A revolta dos marítimos fez-se sentir também noutras localidades ligadas à pesca do bacalhau, como Póvoa do Varzim, Ílhavo, Buarcos (Figueira da Foz), Nazaré e Setúbal.
4 de Julho
Atentado contra Oliveira Salazar, dirigido por Emídio Santana, em Lisboa, com o apoio de um grupo de anarquistas e comunistas, que se mantinham na clandestinidade após terem sobrevivido à repressão na greve de 18 de Janeiro de 1934. Fizeram explodir uma bomba que foi detonada à distância, na Avenida Barbosa du Bocage, quando a viatura do governante acabava de estacionar nesta avenida da capital, mas falharam o alvo.
A investigação da PIDE que levou à identificação dos revolucionários foi conduzida pelo próprio director da polícia política, capitão Agostinho Lourenço, e pelo subdirector, tenente José Catela. Um dos detidos foi Valentim Adolfo João, mineiro em S. Domingos (Mértola) e depois em Aljustrel, anarquista, dirigente sindical, acusado de ter fornecido a dinamite usada no atentado.
❦ 1940 ❦
Maio e Junho
O cônsul português em Bordéus, Aristides de Sousa Mendes, contraria as ordens do chefe do Governo, Oliveira Salazar, e começa a emitir vistos de entrada em Portugal aos refugiados de guerra.
❦ 1941 ❦
José Joaquim Viegas Fuzeta (Zé da Mónica), natural de Olhão, foi preso pela 3.ª vez pela PIDE, vindo a ser torturado continuada e barbaramente, tendo falecido vários meses depois, já em 1942, num hospital, como consequência dos maus tratos na prisão. Mestre de cabotagem, também com ligação ao contrabando, Zé da Mónica transportou na sua embarcação muitos refugiados, que ao tempo da Guerra Civil em Espanha procuravam fugir da guerra e da ditadura.
17 de Dezembro
Ocupação do território de Timor por forças militares holandesas e australianas.
20 de Dezembro
O jornal “Diário da Manhã”, apresenta um artigo onde relata os graves acontecimentos ocorridos em Timor, onde desembarcaram tropas australianas e holandesas.
❦ 1942 ❦
19 de Fevereiro
Invasão de Timor por tropas japonesas, que vieram a criar um campo de concentração na zona de Liquiçá, onde foram detidos os funcionários públicos portugueses. Os nipónicos só abandonaram Timor em 22 de Setembro de 1945.
Maio
É fundada em Coimbra, por Carlos Vaz e Raul Gomes, a revista de cultura e arte “Vértice”, que ao longo de várias décadas foi um baluarte na defesa da literatura antifascista, a par de outra revista mais antiga, a “Seara Nova”.
A revista “Vértice” teve como colaboradores algumas das figuras mais prestigiadas no campo das letras e do jornalismo, como Óscar Lopes, Joaquim Namorado, Mário Dionísio, Joel Serrão e Eduardo Lourenço, entre outros. Também foi seu colaborador, o algarvio Manuel Rodrigues Madeira, residente em Olhão, sobretudo com poesia e artigos de crítica literária e social. De registar ainda, que foi correspondente desta revista na Argentina, António Simões Júnior, um escritor e antifascista natural da freguesia de Quelfes, e radicado naquele país.
5 de Junho
Afundamento do navio bacalhoeiro “Maria da Glória”, que foi bombardeado por um submarino alemão. Dos 44 tripulantes apenas se salvaram 8 homens. Morreram nesta data 36 pescadores, dos quais 12 eram da Fuzeta, e 1 de Olhão.
Foi o caso mais trágico, mas durante a II Grande Guerra foram abatidos por submarinos alemães um total de onze navios, entre embarcações da frota do bacalhau, e também da marinha mercante, causando avultados prejuízos humanos e materiais a Portugal. No entanto, o governo de Salazar fazia propaganda de que era neutral, de que não participava de modo algum no conflito.
❦ 1943 ❦
27 de Julho
Greve nas fábricas da Companhia União Fabril (CUF), no Barreiro, que rapidamente alastrou a outras instalações fabris desta vila, essencialmente industrial, e se prolongou até Agosto. O movimento de protesto foi de iniciativa do Partido Comunista Português (PCP), que na época estava também envolvido num processo de reorganização interna.
Dezembro
É criado o Movimento Nacional da Unidade Antifascista (MUNAF), que foi anunciado publicamente, bem como o seu Conselho Nacional, em Janeiro de 1944. O MUNAF viria a ser presidido pelo general Norton de Matos.
❦ 1944 ❦
Dezembro
É fundada a União Socialista, sendo o resultado da fusão do Núcleo de Doutrinação e Acção Socialista com a União Democrática. Distinguiram-se nesta época militantes como Jaime Cortesão, Sarmento Pimentel, Hélder Ribeiro, Azevedo Gomes e Henrique de Barros, entre outros.
A União Socialista resistiu até 1964, altura em que é criada a Associação Socialista Portuguesa, passando muitos dos seus membros a integrar a nova organização política.
❦ 1945 ❦
4 de Julho
É assassinado pela PIDE na estrada de Bucelas (Loures), o militante comunista Alfredo Dinis, que na clandestinidade usava o pseudónimo de Alex. O jovem Alex (28 anos) foi vítima de uma emboscada montada cobardemente pela brigada do inspector José Gonçalves.
8 de Outubro
Fundação do MUD – Movimento de Unidade Democrática, durante uma reunião da Oposição, que foi autorizada pelo Governo de Salazar, e que se realizou no Centro Escolar Republicano de Almirante Reis, em Lisboa. Nesta reunião, estiveram presentes cerca de 200 pessoas, que subscreveram as primeiras listas do MUD.
O movimento ganhou rapidamente muitos adeptos em todo o País, mas pouco tempo depois, em Janeiro de 1948, haveria de ser ilegalizado por ordem do Governo. Na realidade, a censura continuava, a polícia política também, e os elementos da Comissão Central do MUD em breve conheceriam a prisão.
A Comissão Central do MUD era constituída por José Magalhães Godinho, Teófilo Carvalho dos Santos, Armando Adão e Silva, Gustavo Seromenho, Manuel Catarino Duarte, Manuel Mendes, Guilherme Canas Mendes, Afonso Costa (filho), Luís da Câmara Reis, Alberto Candeias e Mário de Lima Alves.
❦ 1946 ❦
28 de Julho
Constituição do MUD Juvenil, que veio a ter muitos militantes e simpatizantes no Algarve. Fizeram parte deste movimento democrático, muitos jovens antifascistas de Olhão, como: Raul Veríssimo, Francisco Palmeiro Guerreiro, António Simões Júnior, Manuel Rodrigues Madeira, Joaquim Carlos Silvestre, entre outros.
❦ 1947 ❦
23 de Março
Encontro do MUD Juvenil em Bela Mandil, na freguesia de Pechão, no concelho de Olhão. Estiveram presentes cerca de 1000 jovens, vindos de diversas localidades do Algarve.
Joaquim Carlos Silvestre, que fazia parte do Comité Local de Olhão, ficou na estação do caminho-de-ferro desta vila, a fim de indicar o percurso até ao pinhal em Bela Mandil aos jovens que iam chegando. Apesar de ser apenas uma confraternização de jovens antifascistas, veio a ser reprimida fortemente pela PSP e GNR, sendo efectuadas muitas prisões na altura, e posteriormente. A notícia dos acontecimentos de Bela Mandil, chegou também à Radio Moscovo, que na época era uma bandeira do Partido Comunista da União Soviética.
10 de Abril
Nova revolta para derrubar o regime de Oliveira Salazar, sendo o movimento dirigido pelo vice-almirante José Mendes Cabeçadas, algarvio, natural de Loulé. Esta revolta ficou conhecida por “Abrilada”.
28 de Abril
São presos pela PIDE muitos dirigentes do MUD Juvenil, como Mário Soares, e membros deste Movimento, incluindo diversos jovens algarvios.
18 de Junho
São expulsos do ensino professores universitários, cientistas e investigadores, num total de 21 docentes.
❦ 1948 ❦
27 de Junho
Morte de Bento de Jesus Caraça, antigo professor catedrático do Instituto de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF), em Lisboa. As cerimónias fúnebres transformaram-se numa grande manifestação de oposição ao regime instituído.
❦ 1949 ❦
13 de Fevereiro
Candidatura à Presidência da República do General Norton de Matos, que contou com o apoio de MUD, embora já ilegalizado pelo Estado, e de outras forças democráticas. Da Comissão Distrital de Apoio no Algarve, fez parte o algarvio Manuel Rodrigues Madeira, residente em Olhão.
❦ 1950 ❦
2 de Janeiro
É assassinado cruelmente e lentamente, o militante comunista Militão Bessa Ribeiro, na Cadeia Penitenciária de Lisboa.
3 de Maio
Álvaro Cunhal, que fora preso no ano anterior, é julgado e condenado à pena de prisão perpétua.
18 de Dezembro
Transladação dos restos mortais de Manuel Teixeira Gomes da Argélia para o Cemitério Municipal de Portimão, por iniciativa do intelectual algarvio Mário Lyster Franco, defensor da política de Oliveira Salazar, com o objectivo do governo tirar dividendos da situação. Contudo, ocorreu nesta data uma grande manifestação de intelectuais, políticos e democratas em geral, sobretudo algarvios, em particular da Vila de Olhão, não permitindo que o Governo tivesse os dividendos que havia previsto para esta cerimónia.
❦ 1954 ❦
19 de Maio
Assassinato da trabalhadora rural Catarina Eufémia, pelo tenente Carrajola, oficial da GNR, junto à aldeia de Baleizão, no concelho de Beja. Tratou-se de um crime bárbaro e prepotente, que gerou grande indignação na população do Baixo Alentejo, do Algarve, e de outras zonas do País.
❦ 1955 ❦
Foi detido e levado para a prisão de Caxias, o advogado indiano Dr. Mohan Ranade (1929-2019), que lutou pela independência de Goa, liderando o movimento de libertação desta cidade do regime colonial português, nos anos 50 do séc. XX. Após a independência de Goa, em finais de 1961, continuou detido naquele estabelecimento prisional. Só foi libertado em Janeiro de 1969, após 14 anos de cativeiro, por acção do Papa Paulo VI, que pressionou fortemente o governo de Oliveira Salazar para o efeito. Regressou então à Índia e dedicou-se ao trabalho social. Em 2001, Mohan Ranade recebeu o Prémio “Padma Shri”, uma das maiores distinções do País.
25 de Maio
Greve dos pescadores de Matosinhos, Afurada, Figueira da Foz, Setúbal, Sesimbra, Olhão e Lagos, acusando os intermediários do comércio do peixe de serem os principais beneficiários do seu esforço de produção, e que o Governo não impunha medidas para modificar a situação.
É constituído o movimento político Resistência Republicana e Socialista, de que foram membros Mário Soares, Salgado Zenha, e Tito Morais, entre outros destacados antifascistas.
❦ 1956 ❦
10 de Dezembro
É fundado o Partido Popular de Libertação de Angola (MPLA), dirigido por Agostinho Neto, tendo como secretário geral Viriato da Cruz.
❦ 1958 ❦
16 de Maio
Grande manifestação de apoio ao General Humberto Delgado, candidato à Presidência da República, na estação ferroviária de Santa Apolónia, no regresso de uma deslocação ao Porto. Esta manifestação seria fortemente reprimida pelas autoridades policiais.
8 de Junho
Eleições Presidenciais com o general Humberto Delgado, que era muito apoiado pelos democratas e população civil em geral, a obter 23,45 % dos votos. Ficou conhecido na história pelo “general sem medo”, e foi protagonista da célebre frase em relação a Salazar, se ganhasse as eleições:
“Obviamente demito-o”.
❦ 1960 ❦
3 de Janeiro
Fogem dez presos políticos do Forte de Peniche, entre os quais Álvaro Cunhal, histórico secretário-geral do Partido Comunista Português (PCP), e outros destacados membros deste partido, como Francisco Martins Rodrigues e Carlos Costa (um dos fundadores do MUD Juvenil).
15 de Dezembro
A Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) aprova a resolução nº 1542, com 68 votos a favor, 6 votos contra e 17 abstenções, condenando a política colonial portuguesa.
❦ 1961 ❦
22 de Janeiro
De madrugada, ocorreu o assalto ao navio paquete de luxo “Santa Maria”, da Companhia Nacional de Navegação, em águas internacionais, no mar das Caraíbas. Este arrojado assalto foi chefiado pelo capitão Henrique Galvão, representando o Directório Revolucionário Ibérico de Libertação (DRIL), e tinha como objectivo chamar a atenção das entidades estrangeiras sobre a falta de liberdade política que se verificava em Portugal.
O navio foi rebatizado nessa altura de “Santa Liberdade”, e o acto rebelde ficou conhecido por “Operação Dulcineia”. O ataque foi efectuado a partir do navio “Curaçao” de que os revoltosos se conseguiram apoderar durante alguns dias. Participaram também nesta operação revolucionária, Camilo Mortágua, dirigente da LUAR (Liga de Unidade e Acção Revolucionária), e o militar e republicano espanhol, Alberto Bayo.
4 de Fevereiro
Início da guerra em Angola pelo MPLA. Por esta altura, a imprensa estrangeira condena fortemente a política colonizadora do Governo de Salazar.
13 de Abril
“Para Angola, rapidamente e em Força”.
A célebre frase dita por Oliveira Salazar, que marca o início da guerra colonial.
11 de Maio
Foi apresentado à imprensa em Lisboa, o Programa para a Democratização da República, com data de 31 de Janeiro de 1961. Os seus subscritores foram rapidamente detidos pela PIDE.
13 de Outubro
Carta aberta do dirigente Amílcar Cabral ao governo português, reiterando as anteriores propostas do PAIGC para uma solução pacífica do problema da Guiné e Cabo Verde, na sequência do memorando enviado em 1 de Dezembro de 1960.
10 de Novembro
Desvio de um avião da TAP, da linha Casablanca-Lisboa, numa acção dirigida pelo revolucionário algarvio Hermínio da Palma Inácio, em que participaram também Camilo Mortágua e Amândio Silva. Esta arriscada intervenção, que ficou conhecida por “Operação Vagô”, foi um dos primeiros desvios de um voo comercial de que há registo no mundo. O avião sobrevoou Lisboa e outras localidades, tendo sido lançados panfletos denunciando a política de ditadura do regime salazarista, e regressou incólume a Casablanca.
18 de Dezembro
As tropas portuguesas que ocupam Goa, Damão e Diu, rendem-se às forças militares da União Indiana (“Operação Vijay”). Com efeito, a União Indiana não tendo conseguido resolver, por via diplomática, o diferendo que mantinha com Portugal por motivo dos territórios que o nosso País controlava no subcontinente indiano desde o séc. XVI, invade, ocupa e reintegra na sua jurisdição aquelas cidades.
19 de Dezembro
A Organização das Nações Unidas (ONU) condena a política colonial portuguesa, por uma esmagadora maioria de 83 votos contra 3.
Foi assassinado pela PIDE José Dias Coelho, na Rua dos Lusíadas, em Lisboa. Escultor e pintor, militante do PCP, era companheiro da antifascista algarvia Margarida Tengarrinha.
31 de Dezembro
Tentativa de assalto por um grupo de militares e civis, ao quartel do Regimento de Infantaria Nº 3, em Beja, na última noite do ano, dirigido pelo então capitão João Varela Gomes, e onde participou o revolucionário algarvio Hermínio da Palma Inácio. Durante a contenda foi morto o subsecretário do Exército e ficou ferido Varela Gomes. Participaram igualmente outros destacados antifascistas, como Francisco Ramos da Costa e Fernando Piteira Santos.
A acção foi concebida pelo general Humberto Delgado, que reentrara clandestinamente no País, para chefiar este movimento. Apesar da tentativa de golpe ter falhado, fez estremecer o governo de ditadura, e serviu de incentivo para outras intervenções que lhe sucederam.
❦ 1962 ❦
9 de Março
Início de manifestações académicas de protesto, em Coimbra e Lisboa. Estas lutas dos estudantes haveriam de se repetir mais tarde, em 1965, 1968 e 1969.
28 de Abril
Manifestação de mineiros em Aljustrel, reprimida pela intervenção de forças da GNR, de que resultou a morte de dois mineiros e alguns feridos.
1 de Maio
Grande manifestação popular e operária em Lisboa e noutros locais do País.
31 de Maio
Greves e manifestações no Alentejo, com o apoio da estrutura do Partido Comunista Português (PCP), na clandestinidade, que levaram finalmente à concessão das 8 horas diárias de trabalho para os jornaleiros e restantes trabalhadores rurais.
14 de Dezembro
A Assembleia Geral da ONU condena a actuação de Portugal em Angola, e reclama o reconhecimento imediato do direito dos povos à independência, assim como o fim de todos os actos de repressão pelo governo de Oliveira Salazar.
21 de Dezembro
É criada em Argel a Frente Patriótica Nacional (FPLN). Esta organização foi concebida durante a I Conferência de Forças da Oposição, que reuniu socialistas, comunistas e democratas independentes.
❦ 1963 ❦
23 de Janeiro
Início do conflito armado na Guiné pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), dirigido por Amílcar Cabral.
São gravadas duas das mais emblemáticas canções de intervenção ou de resistência: “Os Vampiros”, por José Afonso, e “Trova do Vento Que Passa”, por Adriano Correia de Oliveira. Zeca Afonso era então professor na Escola Industrial e Comercial de Faro, e muitos dos alunos das aulas à noite eram de Olhão; nesta Vila, o cantor e professor convivia habitualmente com pescadores e operários.
❦ 1964 ❦
5 de Setembro
Início da guerra em Moçambique pela FRELIMO, liderada por Eduardo Mondlane, com um ataque efectuado a Mueda, no distrito de Cabo Delgado. Este histórico dirigente africano haveria de ser assassinado a 3 de Fevereiro de 1969, em Dar-Es-Salam, através de uma encomenda armadilhada.
Neste ano de 1964, José Afonso editou outros textos de cariz contestatário, nomeadamente “Coro dos Caídos”, “Vila de Olhão” e “Menino do Bairro Negro”, canções que pelo seu conteúdo, vieram reforçar o ânimo dos milicianos (oficiais e sargentos), intelectuais e da população em geral, na luta para acabar com a guerra e com o governo colonialista.
Por sua vez, o cantor Luís Cília grava em França o disco: “Portugal – Angola, Canções de Luta”, que teve grande impacto na comunidade emigrante.
❦ 1965 ❦
13 de Fevereiro
Assassinato do general Humberto Delgado, em Espanha, perto da zona fronteiriça de Badajoz, em circunstâncias pouco claras, data em que ficou desaparecido. Veio depois a saber-se que foi morto, bem como a sua secretária, Arajarir de Campos, de origem brasileira, por elementos da PIDE que montaram uma cilada ao general.
Os corpos foram encontrados perto da localidade de Villanueva del Fresno, cerca de dois meses depois, a 24 de Abril, na sequência das investigações de uma comissão da Federação Internacional dos Direitos do Homem, enviada a Portugal e Espanha.
21 de Maio
Encerramento da Sociedade Portuguesa de Escritores por ordem do então ministro da Educação Nacional, Inocêncio Galvão Teles, devido a ter sido atribuído por esta instituição cultural o Grande Prémio de Novelística ao escritor angolano Luandino Vieira, pelo seu livro de contos “Luanda”. Esta Sociedade havia sido constituída, entre outros escritores, pelo ilustre intelectual e antifascista algarvio António Assis Esperança.
❦ 1967 ❦
Janeiro
Greve das operárias/os conserveiros do Algarve.
13 de Maio
O Papa Paulo VI deslocou-se ao Santuário de Fátima como simples peregrino, mostrando assim ostensivamente que a visita não era ao Estado político português, por altura das celebrações do 50º aniversário das aparições de 1917. Três anos depois, o mesmo pontífice recebe no Vaticano os líderes dos movimentos de libertação de Angola, Guiné e Moçambique.
17 de Maio
A LUAR (Liga de Unidade e Acção Revolucionária) leva a efeito um assalto à agência do Banco de Portugal na Figueira da Foz, apoderando-se de cerca de 30 mil contos, que era uma grande fortuna para a época (equivalente a 150 mil euros na moeda actual).
17 de Setembro
Nova operação da LUAR, desta vez sobre o quartel sede da 3ª Região Militar, em Évora, apoderando-se de diverso armamento.
8 de Outubro
O comandante guerrilheiro Ernesto Che Guevara, símbolo da luta pela liberdade na América do Sul, foi assassinado na Bolívia por tropas governamentais.
❦ 1968 ❦
4 de Abril
Assassinato de Martin Luther King, reverendo sacerdote afro-americano, activista na luta pelos direitos humanos, em Memphis (USA).
23 de Setembro
Na sequência da incapacidade de Oliveira Salazar, motivada por uma queda, toma posse como presidente do Governo Marcelo Caetano. O seu projecto era liberalizar, mantendo a guerra em África; na prática, aceitava as condições impostas pelos altos comandos militares.
7 de Dezembro
A Associação de Estudantes do Instituto Superior Técnico, foi encerrada pela PIDE, com a alegação de que esta associação era um activo foco de subversão, na sequência de intensas manifestações estudantis, a que não são alheias influências do Maio de 68 em Paris. A resposta da Academia de Lisboa não se fez esperar, tendo de imediato decretado o “luto académico”.
❦ 1969 ❦
17 DE ABRIL
Encontro Nacional de Estudantes em Coimbra.
Setembro
Fundação da Comissão Democrática Eleitoral (CDE), movimento político de oposição ao governo de Marcelo Caetano, que se desenvolveu rapidamente, e conquistou muitos aderentes em todo o País, incluindo também na região algarvia.
❦ 1971 ❦
O cantor Manuel Freire edita o disco “Pedra Filosofal”, que inclui um belo poema de António Gedeão, onde se diz:
“Não há machado que corte a raiz ao pensamento”.
Adriano Correia de Oliveira grava o disco “Cantar de Emigração”, que constitui um sentido tributo às comunidades de emigrantes, sobretudo em França e na Alemanha.
Dezembro
É editado “Cantigas do Maio”, um dos mais emblemáticos discos de Zeca Afonso. É de salientar, que este trabalho foi gravado no Strawberry Studio, em Herouville (perto de Paris), que era na altura um dos melhores estúdios da Europa. Aqui gravaram grupos musicais de renome, como, por exemplo, os Beatles e os Pink Floyd.
Era o reconhecimento no estrangeiro de um grande compositor e intérprete. O disco inclui duas canções com muito significado no que foi a luta contra a ditadura: “Cantar Alentejano”, em memória de Catarina Eufémia, camponesa assassinada em 1954, e “Grândola Vila Morena”, que viria a ser o hino da Revolução.
❦ 1972 ❦
Abril
O político e advogado antifascista Mário Soares editou em Paris o livro que escreveu no exílio “Portugal Amordaçado”. É uma notável obra sobre o regime de Salazar.
O General Spínola, na altura governador da Guiné, procura um entendimento com o PAIGC, por intermédio do presidente do Senegal, Leopoldo Senghor, com quem fala em segredo e lhe propõe um encontro com Amílcar Cabral, líder do movimento de libertação da Guiné. Quando teve conhecimento desta diligência, Marcelo Caetano irritou-se com o atrevimento do general, manda Spínola suspender qualquer outro contacto, e retira-o da Guiné. Cria depois um novo cargo, o de Vice-CEMFA, para “acomodar” o general Spínola, que fica assim ao lado de Costa Gomes, que era o CEMFA.
12 de Outubro
É assassinado pela PIDE o estudante de Direito, José António Ribeiro dos Santos, no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, em Lisboa. Num comício contra a repressão, realizado num anfiteatro do ISCEF, haviam comparecido no local três agentes da polícia política, para dispersar esta pequena manifestação de estudantes universitários.
Entretanto gerou-se a confusão, com os agentes da PIDE/DGS a abrirem fogo, atingindo dois estudantes, um dos quais Ribeiro dos Santos. Este viria a falecer a caminho do hospital. Esta lamentável ocorrência provocou grande agitação no meio académico. O funeral foi uma enorme manifestação de pesar, sendo acompanhado por muitos estudantes e população em geral.
❦ 1973 ❦
21 de Janeiro
É assassinado na Guiné-Conacri, o engenheiro Amílcar Cabral, líder do PAIGC, em circunstâncias pouco claras.
4 a 8 de Abril
Congresso Democrático de Aveiro, organizado pela CDE. No evento participaram os cantores José Afonso e José Jorge Letria. Aqui, Zeca Afonso apresenta a canção “O Que Faz Falta”, que rapidamente se transformou num hino de luta pela instauração de um regime democrático.
19 de Abril
Fundação do Partido Socialista na Alemanha, por um grupo de 27 exilados políticos portugueses naquele país, na sequência da Acção Socialista Portuguesa, que havia sido criada em 1964.
Julho
Marcelo Caetano desloca-se a Inglaterra, retribuindo uma recente visita que o duque de Edimburgo fizera a Portugal, sendo recebido com grandes manifestações de protesto em Londres, onde se incluíam muitos elementos do recém-criado Partido Socialista, que fazia assim a sua aparição pública.
9 de Setembro
Ocorre a primeira reunião do Movimento dos Capitães, em Évora, onde ainda se discutem questões corporativas, como a possibilidade que havia sido dada aos oficiais milicianos de passarem rapidamente aos quadros do Exército, o que não agradava aos oficiais de carreira. Só depois se abordou a situação da guerra colonial. Conclui-se que não há possibilidade de vencer, sendo a solução pôr fim ao conflito. Os generais Costa Gomes e António de Spínola, já anteriormente tinham encarado esta hipótese, ou seja, se não houver um entendimento político com os movimentos de libertação, a derrota seria inevitável.
Setembro
O general Kaúlza de Arriaga, que regressou de Moçambique em finais de Agosto, também pensa em tomar o poder, mas com motivações opostas: continuar a guerra, imprimindo mais convicção e dureza.
28 de Outubro
A ONU reconhece a República da Guiné, como forma de pressionar o Governo português.
1 de Dezembro
Nova reunião dos Capitães, em Óbidos, onde se debate a preparação de uma intervenção para derrubar o Governo, e pôr fim à guerra.
❦ 1974 ❦
31 de Janeiro
António de Spínola edita o livro “Portugal e o Futuro”. Neste trabalho, o general sugere uma solução federativa para África, com a constituição de Estados africanos, e que o regime português tem de se democratizar, e que deve entrar na Comunidade Económica Europeia (CEE).
5 de Março
Reunião do Movimento dos Capitães em Cascais.
24 de Abril, 23h55
A Rádio Emissora Associados de Lisboa, transmite a canção “E Depois do Adeus”, de Paulo de Carvalho. Era a informação dos comandos militares de que estava tudo preparado para a revolta.
25 de Abril, 00h20
Nos estúdios da Rádio Renascença, é emitida a canção “Grândola Vila Morena”, de Zeca Afonso. Era o sinal do início das operações militares, dirigidas pelo major Otelo Saraiva de Carvalho. Este trecho musical haveria de ficar na história como hino da Revolução.
25 de Abril
A promulgação do Decreto-Lei nº 171/74, da Junta de Salvação Nacional, veio por termo a uma das mais duradouras associações de malfeitores de que há memória em Portugal – a polícia da ditadura militar e do Estado Novo.
Esta organização sinistra, foi depois carimbada por Marcelo Caetano de Direcção Geral de Segurança (DGS), quando a aparente liberalização do regime lhe impôs tentar apagar da memória dos portugueses o nome sinistro e as práticas criminosas da sua antecessora PIDE.
Outros Antifascistas Algarvios
Para além dos nomes já referidos neste trabalho, é de salientar, sem dúvida, muitas outras figuras que lutaram contra o governo de ditadura.
Mencionamos a seguir alguns dos nomes de grandes antifascistas algarvios:
António Assis Esperança, António Estrela, António Neves Anacleto, António Ramos Rosa, António Vicente Campinas, Carlos Augusto Lyster Franco, Carlos Brito, Carlos Martins Sovela, Costa Martins (oficial da Força Aérea e membro do Conselho da Revolução), Francisco Palmeiro Guerreiro, Hermínio da Palma Inácio, João Feliciano Galvão, João dos Reis Negrão, João Rosa Beatriz, José Barão, José Correia Pires, José Joaquim Viegas Fuzeta (Zé da Mónica), José Manuel Tengarrinha, José Negrão Buisel, José dos Reis Sequeira, José Rodrigues Vitoriano, José Ventura, José Ventura Duarte, Julião Quintinha, Júlio Filipe de Almeida Carrapato, Júlio Fradinho, Manuel Cabanas, Manuel Paula Ventura, Margarida Tengarrinha, Maria das Dores Medeiros (Lolita Medeiros), Maria de Jesus Barroso, Maria Veleda, Sebastião Viola Júnior, Sidónio Nunes Pacheco, Vitoriano Rosa, entre muitos outros.

Principal bibliografia consultada
– “Portugal 20 Anos de Democracia”, António Reis, 1996
– “Cantores de Abril”, Eduardo M. Raposo, 2000
– “Presos Políticos Algarvios em Angra do Heroísmo e no Tarrafal”, Maria João Raminhos Duarte, 2009
– “Algarve 100 Anos de República 100 Personalidades”, António Rosa Mendes e Neto Gomes, 2010
– “Silves e o Algarve Uma História de Oposição À Ditadura”, Maria João Raminhos Duarte, 2010
– “Vítimas da Ditadura no Algarve”, Idalécio Soares, 2017
– “Memórias do Exílio”, Ana Aranha e Carlos Ademar, 2018
Texto da autoria de Manuel Pereira.
Manuel José de Jesus Pereira nasceu em 1946, na freguesia de Moncarapacho (Olhão). É colaborador frequente do jornal “O Olhanense” e dedica-se à investigação na área da cultura, principalmente na cultura, usos e costumes do Sotavento Algarvio. Entre os seus trabalhos e artigos, destacam-se “As Operárias Conserveiras”, “Os “Maios”, Um Ritual Secular no Concelho de Olhão” “Florbela Espanca, A Memória da Grande Poetisa, Escritora e Feminista” e “Cronologia dos 40 Anos Que Antecederam o 25 de Abril (1934 – 1974)”. Atualmente, está a trabalhar em dois projetos: “Figuras Ilustres e de Referência no Concelho de Olhão (Sec. XV – Séc. XX)” e “Freguesia de Moncarapacho – 550 Anos de História”.